Alan MacDiarmid |
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Herbert Kroemer |
Nos 50 anos que se sucederam à II Guerra Mundial, uma proporção impressionante de físicos e químicos premiados eram imigrantes europeus, que fugiram da perseguição nazista e fascista e da guerra, e ajudaram os EUA a serem a maior potência científica do mundo em física nuclear e armas atômicas (Enrico Fermi, Albert Einstein, Leo Szilard, Hans Bethe, etc.) e em muitas outras áreas. Antes da II Guerra, o padrão era totalmente diverso: ingleses, alemães, austríacos e franceses ganhavam os prêmios em todas as modalidades, pois os EUA tinham ainda um sistema científico relativamente jovem e imaturo. As enormes quantidades de dinheiro gastos para ganhar a Guerra, a atração dos cientistas europeus para o solo americano, e a rivalidade entre a União Soviética e os EUA na Guerra Fria e na corrida armamentista e espacial foram os principais combustíveis da "virada".
Aliás, dinheiro em excesso para os investimentos em ciência é um fator fundamental para entender a dominância dos EUA. A National Science Foundation, um organismo governamental federal de apoio à pesquisa (uma espécie de CNPq de lá) tem 9 bilhões de dólares para investir, e na área médica os National Institutes of Health (NIH), tem outros 7 bilhões. É simplesmente 30 ou 40 vezes mais do que o Brasil investe, apenas essas duas organizações. Além disso, doar dinheiro para pesquisa é um hábito cultural de mais de um século entre os ricos americanos, que dão muita verba para fundar universidades, financiar institutos de pesquisa inteiros, e apoiar pesquisas. São milhares de fundações, algumas delas doando muitas vezes mais do que a verba brasileira para ciência e tecnologia: Melissa and Bill Gates Foundation (recentemente doou mais de 600 milhões de dólares para programas de vacinação infantil, e tem outros 4 bilhões para doar), United Nations Foundation (do milionário Ted Turner, dono da CNN e sócio da Time/Warner/America On-Line, que doou 1,2 bilhão para a ONU), as fundações Rockefeller, Kellog's, Ford, Howard Hughes, McCarthy, etc.
Outro fator importante é o que uma reportagem recente sobre o tema chamou de "o sonho americano", ou seja, um conjunto de filosofias nacionais, que abrangem a democracia estável, a grande mobilidade social através do trabalho e do estudo, o apoio social aos que têm mérito e talento, o estímulo à competitividade extremada, a receptividade à crítica à autoridade estabelecida, o apoio dado à criatividade e iniciativa individual e ao empreendedorismo. São todas características nacionais que são muito identificadas com o espírito científico, e que portanto criam um clima social favorável ao desabrochar e à recompensa das idéias.
Outra coisa curiosa é que o padrão de ensino médio americano não é o melhor do mundo. Os EUA estão em 28o ou 29o lugar no mundo nesse aspecto, atrás de países como o Japão, a Coréia, a Alemanha, a França, a Inglaterra, a Suécia e a Suiça. Essa aparente disparidade é apenas estatística, no entanto. O que tem de escolas de alto nível nos EUA é suficiente para gerar geninhos científicos para os próximos 100 anos. E o ambiente que permite aproveitá-los é o que conta. Talvez existam 10 Einsteins em potencial entre as crianças brasileiras, mas quantas delas poderão ir para um colégio realmente bom, e depois para uma faculdade no nível de uma Harvard ou Princeton, para se desenvolverem? Os americanos são obsessivos em localizar rapidamente esses talentos, e darem apoio para que eles tenham sucesso e contribuam para a nação. Aqui eles são desperdiçados em sua maioria, pois não há ambiente que permita aproveitar seu potencial.
Mesmo para quem é americanófobo e não gosta dos EUA, é difícil deixar de reconhecer as razões positivas para tantos prêmios Nobel em Ciências e Economia (notem que essa dominância não se estende aos prêmios de Literatura e Paz…). Temos, na minha opinião, que tentar imitá-los, e talvez em 30 a 40 anos começaríamos a ter um retorno. Vejam só o sucesso do Projeto Genoma brasileiro, que deslanchou e chamou a atenção mundial graças a investimentos relativamente modestos feitos pela FAPESP. Podemos chegar lá um dia, com certeza.
Publicado em: Jornal Correio Popular, Campinas, 13/10/2000.
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