No Brasil, temos a péssima tendência de copiar as tecnologias mais avançadas dos países desenvolvidos, sem levar em conta o contexto cultural e histórico, os custos, e a capacidade que os usuários vão ter de utilizá-la. O resultado é que muitas vezes passamos literalmente do carro-de-boi ao Boeing, sem nunca termos usado as tecnologias intermediárias, que podem ser tão efetivas quanto as mais sofisticadas e modernas.
O famoso inventor Thomas Alva Edison, que era um gênio prático (nunca fez nenhuma faculdade de engenharia, mas revolucionou a humanidade com suas descobertas, e fundou a empresa General Electric e várias outras para explorar comercialmente seus inventos), desenvolvou um teste interessante para selecionar os engenheiros que queria contratar para seu laboratório. Quando um novo candidato se apresentava, Edison dava-lhe uma lâmpada incandescente ao rapaz e pedia que calculasse o seu volume interno. Ora, a lâmpada, como todos sabem, tem uma forma bastante complexa. O coitado do engenheiro ficava horas e horas às voltas com paquímetros (régua de alta precisão), calibres, fórmulas matemáticas e calculadora, e, depois de muito suar, apresentava o resultado a Edison. Ele então abria a lâmpada, enchia-a de água e derramava em uma proveta calibrada. Quase sempre o engenheiro tinha errado…
Outro exemplo edificante: quando a Xerox começou a fabricar máquinas fotocopiadoras na India, ela logo quis fabricar os modelos mais avançados, que tinham separadora automática de cópias múltiplas (classificadora). O governo indiano proibiu. O motivo: uma máquina fotocopiadora manual dava emprego para três pessoas. A máquina automática dava emprego para apenas uma. A Xerox, evidentemente, não gostou nem um pouco, pois as máquinas automáticas eram muito mais caras. Mas ela não tinha entendido o contexto cultural e demográfico da India. Imaginava, provavelmente, que as coisas por lá eram como nos EUA, onde a mão-de-obra para este tipo de coisa é muito cara, justificando-se, portanto, a sua substituição por máquinas.
Quando vou para os EUA,
eu freqüentemente uso uma dessas lojas que oferecem toda espécie
de serviços de fotocópia, fotografia, uso de computadores,
impressoras, etc.; como se fosse um escritório sucedâneo para
quem está longe de sua base. Ficava perto do meu hotel, e era ótima.
Notei, no entanto, que mesmo nos horários de pico a loja inteira
era atendida e operada por um único funcionário. Era tudo
automatizado. Isso no Brasil seria uma novidade muito apreciada, mas meio
sem sentido, frente ao nosso índice de desemprego.
Infelizmente existem poucos centros de estudos dedicados às tecnologias sociais adequadas no Brasil. Sua disseminação teria uma grande utilidade para definir onde o governo e a sociedade devem aplicar dinheiro, em áreas críticas, para otimizar os resultados.
P.S.: Embora as invenções necessárias para a exploração espacial tenham custado quantias ridiculamente altas de dinheiro, o fato é que a tecnologia não espacial se beneficiou muito dessas invenções. Entre elas: processamento digital de imagens médicas, antenas de TV por satélite, botas de esqui, código de barras para identificação, equipamento para combate ao fogo, controladores de joystick para videogames, material cerâmico para próteses dentárias, revestimento para óculos de sol, aspirador de pó portátil, e.... canetas espaciais.
Quanto à historinha
da NASA no começo deste artigo, é apenas parcialmente verdadeira.
O fabricante Fisher realmente gastou 1,2 milhões de dólares
em 1965 para pesquisar e desenvolver uma caneta esferográfica contendo
um compartimento pressurizado de tinta, mas não foi a NASA que pediu.
Os primeiros astronautas americanos usaram lápis, como os russos.
Depois Fisher vendeu 500 canetas à NASA por US$ 2.50 cada. Como
a caneta é ótima, desde então todos os astronautas
(inclusive os russos, a bordo do MIR), têm usado a Fisher Space Pen.
Um detalhe curioso: qualquer pessoa atualmente pode comprar réplicas
exatas e funcionantes da famosa Vector
Fisher Space Pen usada pelos astronautas, por apenas US$ 29.95.
Publicado em: Jornal Correio Popular, Campinas, 9/11/2001.
Autor: Email: renato@sabbatini.comCopyright © 2001 Correio Popular, Campinas, Brazil