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O futuro é a Informática

Renato M.E. Sabbatini

A revista "Veja" da semana passada, copiando uma matéria da revista norte-americana "Time", publicou extensa matéria sobre as tecnologias do futuro, e como elas deverão afetar nossas vidas. Ao lado de coisas óbvias (como as redes de computadores, que já estão sendo extremamente influentes em uma "reengenharia" global da sociedade), a reportagem cita coisas que ainda estão no domínio da ficção científica, quanto ao seu uso extenso e indiscriminado (realidade virtual, por exemplo). O que mais impressiona, no entanto, é a esmagadora dominância das técnicas digitais, ou seja, baseadas em computadores. Das dez áreas identificadas pela Time como sendo as de maior importância para as tecnologias futuras ("futuretech"), pelos menos seis são diretamente dependentes ou relacionadas à eletrônica digital. A lista é a seguinte:

Outra coisa que nos faz pensar (e ficar preocupados) é a ausência quase que total do Brasil como contribuinte efetivo e em nível internacional, na maioria dessas áreas tecnológicas. Com exceção da engenharia genética, e um pouco na área de novos materiais, as demais praticamente inexistem no país como áreas de pesquisa e desenvolvimento ! É uma conclusão simplesmente estarrecedora, e difícil de justificar, pois, embora algumas delas tenham necessidade de grandes investimentos, nada impede que o Brasil se posicione bem na maioria desses campos.

Há algo de profundamente errado nisso, é óbvio. Se queremos que o nosso país seja realmente um país de primeiro mundo em um prazo razoavelmente curto, é necessário um investimento grande no desenvolvimento da ciência e da alta tecnologia. Informação é poder, e não há a menor dúvida que os países dominantes no Século 21 serão aqueles capazes de liderar a inovação tecnológica. O governo brasileiro tem projetos prioritários em C & T há muitos anos, sendo a Informática um dos principais. Entretanto, isso tem surtido muito pouco efeito com relação ao nosso posicionamento no ranking mundial de inovação tecnológica. Nas últimas décadas, a única inovação tecnológica legitimamente brasileira, e reconhecida internacionalmente, foi o Programa Nacional do Álcool. E mesmo este, infelizmente, está em franca decadência, tendo sido abandonado gradativamente (hoje menos de 10 % dos veículos nacionais tem motores a álcool: essa proporção já foi de 80 %).

Creio que já perdemos a oportunidade, ou a "janela no tempo", de conseguirmos nos equiparar aos países desenvolvidos em termos de capacitação tecnológica na área de hardware de computadores. Essa oportunidade foi a famosa "reserva de informática". Quando ela foi instituída, era relativamente pequeno o retardo do Brasil em relação aos países mais avançados, na área de projeto e construção de computadores, principalmente computadores de pequeno porte, que hoje são maioria. Com um esforço bem dirigido e conjunto da indústria, do governo e da universidade, poderíamos ter hoje uma posição privilegiada. Infelizmente, não foi isso que aconteceu. O governo não investiu corretamente na formação de engenheiros e cientistas qualificados, a indústria só quis aproveitar o máximo a situação protecionista, e a universidade, embora tenha crescido bastante nessa área, pouco fez para contribuir para um bom relacionamento com a indústria, e para o aproveitamento de pesquisas para o setor produtivo. Resultado: acabada a reserva, a "indústria" nacional praticamente deixou de existir como tal, com rarissimas exceções.

O artigo da Time tem também algumas omissões curiosas. Por exemplo, não se arrola como sendo tecnologias de grande impacto a robótica e a Inteligência Artificial. Essas áreas estão tendo muito mais influência no desenvolvimento da indústria do próximo milênio do que, por exemplo, a nanotecnologia e a realidade virtual. Elas são reais, e já têm grande importância econômica. Por exemplo, a afamada competitividade industrial japonesa em muitos setores, como na indústria automobilística, depende dramaticamente dos robôs industriais. Existem cerca de 60 mil deles no Japão, e a cada ano são agregados 10 mil mais ao processo produtivo em todos os setores. Os sistemas computacionais inteligentes também são outra tecnologia que está penetrando nossa sociedade de forma quase "invisível", pouco notada. A tecnologia de reconhecimento de voz é uma aplicação da IA, e foi incluída na lista da Time, mas de maneira nenhuma é a única. Existem, por exemplo, centenas de sistemas especialistas (programas de computador que utilizam técnicas de IA para imitar a atividade intelectual de especialistas humanos) em ação em empresas financeiras. O usuário não sabe, mas quando ele solicita um empréstimo a um banco norte-americano, seu cadastro financeiro é examinado por um desses sistemas especialistas, que avaliam o risco de se fazer o empréstimo, para o banco. A mesma coisa acontece na área de seguros. Imaginem a quantidade de dinheiro economizado (ou ganho) por esses sistemas especialistas...

Felizmente, nessa área de software, ou de aplicações da Informática, o Brasil tem maiores chances de se posicionar bem em nível mundial.


Publicado em: Jornal Correio Popular,Caderno de Informática, 22/3/95, Campinas,
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