Muito se tem especulado sobre o futuro da educação, em um mundo em que os computadores são cada vez mais portáteis, potentes e baratos. Recentemente, vi uma fotografia muito interessante em um número de uma revista dedicada à computação "sem fio" (computadores ligados à redes através de radio ou infravermelho). Um grupo de alunos, sentados no gramado e na escadaria de uma escola de segundo grau, assistia a uma aula ministrada pelo professor com o auxílio da Internet. Cada aluno tinha um computador notebook no colo, ligado por rádio à rede da escola. Fantástico. Coisa do futuro ? Não, a "computação ubíqua" (presente em todos os lugares), como a chamam os americanos, já é uma realidade palpável, e será lugar-comum em poucos anos, constituindo um novo e poderoso fenômeno tecnológico.
O pai da idéia da "biblioteca virtual portátil" é um americano genial chamado Alan Kay, atualmente um consultor tecnológico de alto nível da empresa Apple Computer. Em 1967/68, Kay era um dos pesquisadores do legendário Palo Alto Research Center (PARC) da Xerox Corporation, perto de Stanford, na Califórnia, uma verdadeira incubadora de empresas de alta tecnologia (a Hewlett-Packard também fica lá). O PARC era um criadouro vertiginoso de novas e revolucionárias idéias sobre computação interativa, embora o microprocessador e os computadores pessoais fossem ainda um fragmento na imaginação de uns poucos sonhadores, entre os quais se contava Alan Kay.
Kay escreveu um artigo profético, em uma revista de computação aplicada à Psicologia, em 1968, que tive a oportunidade de ler em primeira mão, na época. Ele previu a existência, em cerca de 25 anos, de um computador tão compacto e portátil, que seria possível os estudantes carregarem para todas as aulas, e que daria acesso a um acervo de milhares de livros didáticos e científicos, ultracompactados em sua memória. A esse computador, que teria o aspecto e tamanho aproximados de um livro, e que não necessitaria o uso de teclado, Kay batizou de Dynabook (dos termos, em inglês, dynamic book, ou livro dinâmico). Kay analisou cuidadosamente qual seria o impacto possível desse recurso tecnológico interativo sobre a educação básica, e concluiu que ele afetaria enormemente o acesso à informação, o uso das bibliotecas, a existência dos livros e até dos próprios professores.
Depois disso, o PARC foi desmontado em parte, devido ao fracasso comercial de suas criações tecnológicas, e Kay, depois de um período como professor na universidade, foi contratado pela Apple. Não sei afirmar se foi em conseqüência de sua consultoria, ou não, mas o fato é que precisamente 25 anos depois de seu artigo profético, a Apple lançou a primeira geração de microcomputadores ultraportáteis, sem teclado, a que denominou de PDAs (personal digital assistants), e que são, em conceito, a coisa mais próxima possível do dynabook. O Newton Message Pad foi o primeiro produto dessa linha. Ele é capaz de reconhecer a escrita manuscrita, e pode ser ligado por rádio celular a uma rede de computadores. Só não tem um CD-ROM ainda, pois eles ainda são muito grandes para serem integrados ao sistema. Mas, alguns PDAs, como os fabricados pela empresa Franklin, já permitem acesso simultâneo a até dois livros eletrônicos armazenados em módulos removíveis de 10 Mbytes de capacidade cada. Centenas de livros já foram lançados pela Franklin nesse formato. Em minha área, por exemplo (Medicina), é possível ter-se um livro de Medicina Interna (Harrison) e um manual de referência com cerca de 10 mil medicamentos (o PDR), em um total de mais de 5 mil páginas on-line, por cerca de 350 dólares, com o computador incluído ! Curiosamente, tanto o Newton quanto o Franklin não foram os sucessos comerciais que seus criadores esperavam, mas o CD-ROM também foi um grande fracasso de vendas no início de sua carreira, devido à falta de um padrão internacional.
Prevê-se que, daqui há alguns anos, os CD-ROMs terão dois centímetros de diâmetro, serão totalmente portáteis, e serão capazes de armazenar o texto completo de 5 mil livros. O sonho aparentemente maluco de Alan Kay será então uma realidade.
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