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Direitos autorais e a Internet

Renato M.E. Sabbatini

A criação intelectual vale dinheiro, e a legislação de proteção dos direitos autorais foi a primeira realmente internacional, pois ela foi necessária para regulamentar a indústria editorial, de filmes, de músicas, etc. Essa é uma invenção tipicamente do século XX, pois surgiu apenas em função dos interesses das editoras e produtoras culturais de massa.

Agora a Internet e os CD-ROMs apareceram para bagunçar completamente a noção tradicional e reverenciada do “copyright” (direito de cópia). Por exemplo, atualmente tudo que se coloca publicamente na Internet pode ser copiado: imagens, textos, arquivos, etc. Se o autor ou o produtor colocarem o termo copyright fulano de tal, essa peça intelectual estará automaticamente protegida quanto aos direitos de cópia. Mas, na prática, como todo mundo que faz xerox de livro sabe, a teoria é outra. Aliás, o xerox é um exemplo acabado de como é fantasioso o direito legal do autor contra cópias não autorizadas de sua obra. Nesse ponto, a Internet não é diferente, só facilita em muito a cópia, pois ela não tem custo, como o xerox, e é muito mais rápida. Além disso, você pode copiar textos e imagens à distância, estejam onde estiverem, agravando em muito o problema (normalmente você não teria acesso a um livro, digamos, impresso e armazenado em uma biblioteca na Mongólia Exterior...).

Essa facilidade está tirando o sono dos donos de editoras. Como continuar a ganhar dinheiro com isso ? Existem vários modelos. Um deles, evidentemente, é cobrar pelo acesso à informação. Pela lei da oferta e da procura, quanto mais cópias de uma obra foram vendidas, mais barata será uma cópia. Mas como quantificar isso na Internet, se não se sabe de antemão quantas pessoas lerão a informação (ou para usar um jargão da Informática, “acessarão” a informação, o que é diferente de ler) ?

Outra “lei” seguida pelas editoras é a de compensação por facilidade de cópia, e que funciona em sentido contrário à anterior. Quanto mais pessoas acessarem a mesma informação, a teoria diz, maior deverá o preço a ser cobrado por ela. Por exemplo, a assinatura de uma revista pela biblioteca é mais cara que a assinatura individual, o preço de uma base de dados a ser colocada na rede é maior do que a da mesma base distribuída em CD-ROM, e assim por diante. De novo, a Internet subverte todo o esquema, pois como o acesso é global e de quantificação impredizível, o produto a ser oferecido ficaria absurdamente caro, se tomasse a estimativa pelo máximo.

Um problema adicional tem deixado preocupado os autores. Se qualquer pessoa pode copiar os textos e imagens de uma página na WWW, então o plágio se torna extremamente fácil. Republicar a mesma obra, “costurada” e modificada, sob o próprio nome, pode se tornar uma constante. O direito autoral é desrespeitado, e a fiscalização torna-se muito difícil, dado o volume enorme de material existente na Internet e nos CD-ROMs, sem falar nos danos provocados pela fraude (no começo do ano, uma imagem da artista Sandra Bullock foi copiada, alterada eletrônicamente pela adição de um corpo nú de outra mulher à cabeça da artista, e recolocada em um “site” pirata). Na Internet, felizmente, existem índices globais extremamente poderosos, como o Altavista, que indexa cada uma das palavras de 30 milhões de documentos. Mas mesmo assim é difícil, pois o mecanismo de busca é primitivo demais para detectar plágios complexos. Usando técnicas baseadas em Inteligência Artificial, que estão começando a se tornar disponíveis para o grande público, um “robô de software” (um agente autônomo, que percorre esses índices para achar padrões) poderá localizar plágios e cópias não autorizadas, se eles estiverem publicamente disponíveis na rede. Mas e se não estiverem ? Aí o problema é praticamente insolúvel.

Está ficando cada vez mais urgente a discussão de problemas desse tipo, para não atrapalhar o crescimento dos meios eletrônicos de informação.


Publicado em: Jornal Correio Popular, Campinas, 4/6/96
Autor: Email: sabbatin@nib.unicamp.br

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