Tendo perdido
a primeira batalha contra o governo americano, a poderosa empresa Microsoft
encontra-se frente a frente com sua primeira queda na preferência
dos investidores da bolsa (seu valor de capitalização de
mercado caiu mais de 40% em menos de um mês) e um futuro incerto.
O governo federal e 17 dos 19 estados que a processaram por formação
de monopólio econômico já apresentaram as soluções:
a principal delas obrigaria a Microsoft a se dividir em duas empresas:
uma dedicada somente ao sistema operacional Windows, e outra aos aplicativos,
como o Microsoft Office, ambos campeões do mercado (com 94% e 90%,
respectivamente). Essas empresas teriam diferentes diretores e não
poderiam se associar ou fazer joint-ventures pelos próximos 10 anos.
Além disso, seriam impostas novas regras para venda do Windows para
os fabricantes de computadores, entre as quais deles poderem modificar
a aparência do mesmo na tela. Isso tudo deixou os investidores nervosos,
e os empregados da Microsoft, também.
Ironicamente, no entanto, as duas empresas resultantes da Microsoft poderão se dar muito melhor do que uma única companhia. Primeiro, elas continuariam donas de um monopólio real em suas respectivas áreas. Segundo, o sucesso do Microsoft Office não é conseqüente ao fato dos seus desenvolvedores terem acesso aos segredos internos do Windows, como se imagina. Competidores como a Lotus Smart Suite, imensamente mais baratos, têm praticamente todas as características, funcionalidade e velocidade do Office, mas não ganharam o mercado por um problema de marketing e de imagem, e não por tecnologia diferenciada. Aliás, faz muito tempo que o Microsoft Office muda muito pouco entre uma versão e outra, não oferecendo um diferencial real para os usuários, mas mantendo um preço artificialmente alto.
Esse efeito benéfico da divisão, imposto pela Justiça americana anos atrás à Bell Telephones (atual AT&T), e que levou a diversas empresas com um critério regional (as chamadas "baby Bells", como a Bell South, Bell Pacific, etc.), poderia não se repetir com a Microsoft, pois a maior ameaça a ela não se chama governo e nem consumidor, mas sim o sistema operacional aberto Linux. Na área de aplicativos, o preço poderia cair um pouco, em função de maior concorrência entre os desenvolvedores de soluções para Windows, mas, novamente, a Internet tem muito mais força e impacto em relação a qualquer direção que a tecnologia de software tomar, do que uma oferta de pacotes "stand-alone" (isolados).
Por outro lado, essa encrenca jurídica ainda pode demorar meses para ser resolvida. A Microsoft se opõe à divisão, é óbvio. Mas pode se machucar muito durante o doloroso processo legal.
A Microsoft é tão importante para o desenvolvimento da nova "sociedade de informação", que é praticamente impossível imaginar o quão abrangentes e profundas serão as conseqüências de sua divisão em duas ou mais empresas separadas e impedidas de se interrelacionarem em nível comercial. Basta saber que nove entre cada dez microcomputadores no mundo utilizam o sistema MS Windows, e que softwares como o Internet Explorer e o MS Office têm uma dominância de mercado acima de 80% Além disso a Microsoft esteve diretamente envolvida na maioria dos grandes avanços na área de software, como a adoção de um padrão para o CD-ROM e a sua consequente popularização, o desenvolvimento de diversos padrões de imagens e sons digitais, etc. A força da empresa é tão grande, que, quando lança um novo produto ou padrão, é comum que ele se imponha sozinho contra os concorrentes apenas pelo enorme número de máquinas que o utilizam. As outras empresas, naturalmente, devem odiar...
A Microsoft promete lutar até a última trincheira contra a decisão da Justiça americana, pois se considera injustiçada. Alega que o único "pecado" que cometeu foi ser eficiente demais, e que agora está sendo punida por isso. Afirma, também, que utilizar suas vantagens competitivas para ganhar mais mercado não tem nada de errado, nem é diferente do que todas as outras empresas fazem em suas áreas de atuação.
Uma das principais peças de acusação do governo contra a Microsoft diz respeito ao programa Internet Explorer, atualmente o mais popular dos softwares de navegação e visualização da Web ("browser"). Ao oferecer gratuitamente o programa, e, posteriormente, ao incorporá-lo ao sistema operacional Windows, o "rolo compressor" da Microsoft, citado acima, não demorou para se fazer sentir. O grande concorrente do IExplorer, o programa da Netscape, detinha 80% do mercado, e em dois anos inverteram-se as posições. A Netscape acabou sendo vendida para a America On Line, provedor americano de acesso à Internet, e perdeu a sua grande expressividade. Passa tudo a ser uma questão de interpretação subjetiva, quando a Microsoft diz que a incorporação do Iexplorer ao sistema operacional era inevitável com o avanço da Internet, e que isso fazia parte da remodelação do sistema Windows (versão 98 em diante), no sentido de integrar a interface gráfica e as funções de navegação no "desktop" (computador local) e na Internet.
Quem tem razão?
Veja também: Índice
de todos os artigos anteriores de Informática do Dr. Sabbatini no
Correio Popular.
Publicado em: Jornal Correio Popular, Campinas, 5/5/2000
e 12/5/2000.
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