O microprocessador é a mais complexa criação tecnológica da humanidade. Microprocessadores modernos de 32 bits, como o Pentium Pro, tem dezenas de milhões de componentes internos, miniaturizados até chegar ao tamanho de uma célula sangüínea, e empilhados em até quatro camadas de circuitos abismalmente complicados. Tudo isso em um espaço de alguns centimetros quadrados. O desenvolvimento de um novo chip demora de três a cinco anos, e custa hoje entre 2 a 3 bilhões de dólares. É uma brincadeira apenas para gente muito, muito grande.
E gente grande, no caso, existem poucas. A empresa americana Intel, que foi a inventora do primeiro microprocessador de 4 bits, o Intel 4040, há cerca de 25 anos atrás, é o líder inconteste do mercado: 85 % dos computadores pessoais do mundo tem "Intel Inside", como diz a propaganda. No primeiro semestre de 1997, a Intel teve faturamento bruto de 6,5 bilhões de dólares, e todos os seus produtos são sucessos instantâneos (ela já vendeu mais de 65 milhões de chips da linha Pentium). O segredo da Intel é simples: inovação continua, e alianças estratégicas com grandes fabricantes, como a IBM. Seus centros de pesquisa, com milhares dos melhores engenheiros de eletrônica digital do mundo, já estão preparando a nova geração de chips, de codinome Merced, com 64 bits. Serão verdadeiros supercomputadores-em-um-chip, e estarão disponíveis, segundo as previsões, em 1999.
Mas agora a Intel está sob fogo cruzado. Um dos seus concorrentes de maior sucesso, a empresa Cyrix, fabrica e vende um chip compatível com o Pentium e recentemente entrou com um processo na Justiça americana contra a Intel, supostamente por violações de patentes detidas pela Cyrix (em outras palavras: pirataria tecnológica). Outra concorrente, a segunda maior empresa de informática do mundo, a Digital Corporation, de Massachusetts, também entrou com um processo pelo mesmo motivo. A Digital é a única concorrente que tem duas características: seu chip (o Alpha Digital) é mais rápido que o Pentium Pro, e, ao mesmo tempo, incompatível em software e hardware com ele. A Digital investiu 2,5 bilhões de dólares no desenvolvimento do Alpha, que seria a sua salvação financeira. Entretanto, os planos ruíram. O ano passado, a Digital vendeu apenas 200 mil Alphas, e este ano vai vender menos ainda (60 mil). São quantias ridículas perto da gigantesca Intel, sem contar que o Alpha é muito mais caro.
O ataque da Digital foi respondido pedrada por pedrada pela Intel, que não brinca em serviço. Ela processou a Digital de volta, a semana passada, com evidências de que teria ocorrido o inverso do que a empresa está alegando, ou seja, na realidade foi a Digital que pirateou soluções tecnológicas desenvolvidas pela Intel. Como resultado, as ações das duas companhias cairam na bolsa de Nova Iorque, até os analistas financeiros conseguirem entender quem tem razão. Em 1990, a Intel e a Digital chegaram a namorar brevemente, quando o chip Alpha era muito mais avançado do que qualquer coisa que a Intel tivesse na época. Mas as negociações não deram resultado, e o acordo de confidencialidade entre as duas nunca foi assinado.
Felizmente, graças à economia de mercado, a Intel não pratica preços abusivos. Ao contrário do que acontece no Brasil, com o aumento do volume de vendas e a obsolescência tecnológica causada por novos lançamentos, os preços dos chips caem muito rapidamente, em questão de meses. Em virtude disso, grandes fabricantes, como a Compaq, já estão podendo oferecer preços menores do que 1000 dólares em equipamentos completos baseados em Pentium.
Os próximos dois anos serão muito interessantes para o mundo dos microchips.
Publicado em: Jornal Correio Popular, Campinas, 17/06/1997.
Autor: Email: sabbatin@nib.unicamp.br