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Um monopólio de competência

Renato Sabbatini

Existem poucas pessoas tão admiradas ou vilipendiadas na indústria mundial de Informática quanto William Gates III, o fundador e presidente da poderosa Microsoft Corp. É difícil não tomar uma posição em relação a ele, a favor ou contra.

No dia 3 de março, em uma audiência no Senado americano, Bill teve uma oportunidade de se defender publicamente das crescentes acusações de que a Microsoft detém um monopólio na indústria do software, e que está usando de práticas ilegais e coercitivas contra companhias competidoras. O ministério da Justiça vem tentando achar uma brecha para lascar-lhe uma acusação antitruste, que é uma coisa séria nos EUA (a IBM escapou por pouco de uma, na década dos 80s),

A comissão parlamentar de inquérito colocou frente a frente Gates e vários de seus competidores mais amargos, entre os quais Scott McNeally, presidente da Sun Microsystems, uma das maiores indústrias de estações de trabalho e Jim Barksdale, presidente da Netscape Corp., criadora do famoso "browser" para Internet.

No seu depoimento, Bill Gates saiu-se muito bem, segundo os observadores, embora tenha sido de um cinismo muito grande. Quando um dos senadores perguntou se se dominar 90 % do mercado de sistemas operacionais (como o Windows) não era monopólio, Gates respondeu firmemente que não. Ele argumentou que a Microsoft detém essa posição devido ao mérito dos sistemas que desenvolveu, e que a posição pode ser perdida a qualquer momento, devido à investida dos competidores. Segundo ele, "no tempo correspondente ao mandato de um senador, a minha empresa cria um software, ele se torna popular, e depois não é usado por mais ninguém". Ele acha que se deixar de fazer mudanças e aperfeiçoamentos contínuos em seus softwares, pode vir alguém e tomar o mercado que hoje é dela.

Gates ao mesmo tempo tem razão e não tem. Além do Windows não existe mais nenhum sistema operacional alternativo para PCs. E nem vai existir, pois estima-se que seja necessário investir entre 2 a 3 bilhões de dólares para criar uma alternativa efetiva, com grandes chances de não dar certo (vejam o que aconteceu com o OS/2, a tentativa fracassada da IBM de competir com a Microsoft). Portanto Tio Bill está sozinho no mercado, e, a não ser por uma catástrofe que elimine sua companhia, vai continuar sendo.

Aliás, os usuários e os especialistas também acham que as ações antitruste do ministério da Justiça são equivocadas e vão contra o espírito empresarial norte-americano. Eles acham que a Microsoft cria ótimos produtos, uma eficaz estratégia de marketing, e que não "dorme sobre os louros", aperfeiçoando-os continuamente. Acham que o governo não deveria se meter, pois corre sério perigo de causar um efeito contrário ao que apregoa, e que as queixas da competição são infundadas.

O bafafá atual foi criado em parte pela decisão de Gates de oferecer o seu "browser", o Internet Explorer, embutido e gratuito na mais recente versão do Windows. A Justiça obrigou-o a voltar atrás. Perguntado sobre isso no Senado, Gates fez pouco caso. Ele acha que a coisa mais fácil do mundo é trocar de "browser" se você não gostar do Explorer: demora uns cinco minutos, segundo ele. Acho que realmente é um erro idiota impedir que o dono de um sistema operacional ofereça gratuitamente os complementos que bem desejar. Além disso, o novo Windows integra de maneira eficiente a Internet e os programas locais em uma única interface de usuário, e para isso o IE é uma peça essencial.

A prova de que Gates está correto em suas afirmações é que apesar do verdadeiro rolo compressor montado pela Microsoft, ela foi incapaz até agora de ganhar o mercado dos "browsers", estabilizando-se em um fatia de 50 %. E isso ocorreu simplesmente porque o Netscape Navigator realmente é mais simpático e melhor.


Publicado em: Jornal Correio Popular, Campinas, 17/3/98.

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