Nicholas Negroponte, o festejado autor de "Ser Digital", um bestseller mundial sobre a sociedade da informação, e fundador do não menos famoso Media Lab, do Massachussetts Institute of Technology (MIT) tem uma colocação interessante sobre o futuro da informação: ele atribui a transição que estamos vivendo a um duelo entre os átomos e os bits (a menor unidade de informação digital). Com isso, ele quer dizer que a transmissão da informação baseada em matéria (átomos), ou papel e tinta, tem tantas desvantagens, que está fadada a ser substituída pela transmissão da informação baseada em bits (elétrons, em última análise).
Negroponte dá um exemplo capital: o que acontece em uma biblioteca real e em uma biblioteca virtual. Na biblioteca real, quando um leitor retira um livro, a biblioteca perde temporariamente os átomos que constituem o livro, os quais passam a pertencer ao leitor que o retirou, e a ninguém mais, enquanto ele não for devolvido. Numa biblioteca virtual, o livro é feito de bits,portanto, ao ser consultado e copiado para o computador do leitor, ele continua no mesmo lugar onde está armazenado. Milhões de leitores podem acessar o mesmo site, home-page, documento, revista ou livro na Internet, e isso não causa nenhuma perda ou efeito sobre a fonte da informação !
Se pensarmos bem, isso é uma coisa realmente revolucionária, única na história da humanidade. Podemos argumentar que as outras mídias eletrônicas, como a TV e o rádio, também se comportam assim. Acontece que a Internet tem uma diferença fundamental: a informação é conseguida por demanda do usuário, e não quando o transmissor deseja. Se você perder uma transmissão de TV, não tem como solicitar que a estação a transmita individualmente, apenas para você. A World Wide Web permite.
Como já tive oportunidade de escrever nesta coluna, as revistas e jornais impressos parecem estar vivendo um grande dilema: continuar existindo apenas na forma impressa, ter também uma versão on-line, ou acabar definitivamente com o papel e a tinta, ficando apenas na Internet ?
A WWW é um fenômeno ainda muito novo (temos que lembrar a todo instante que ela não tem mais do que quatro ou cinco anos de existência, e o seu crescimento fenomenal, que chegou a ser de mais de 6.000 % ao ano, ainda está apenas na tenra infância), portanto a solução para este dilema ainda está indefinido, principalmente com relação ao modelo econômico. Ninguém imagina que vai usar o telefone sem ser cobrado por isso (tarifado) pela companhia telefônica, ou que vai receber diariamente um jornal em casa sem ter que pagar assinatura. No entanto, é o que todo mundo quer fazer na Internet.
Para muitos editores de publicações periódicas, o acesso eletrônico, universal e gratuito é uma ameaça real, que representaria a perda de todo seu ingresso financeiro através da venda de assinaturas. Em conseqüência, a maioria das publicações on-line que também existem em papel adotam um dos seguintes esquemas de sobrevivência: 1) colocam na Internet apenas o sumário da publicaçào (títulos, uma ou outra imagem, nenhum texto, ou no máximo uma ou duas linhas explicativas; 2) colocam o sumário, e mais os resumos dos artigos, e talvez um ou outro artigo completo (o que os especialistas chamam de "teasing", ou provocaçào, em inglês); 3) colocam na Internet o texto completo, mas apenas para assinantes ou para usuários que queiram pagar artigo por artigo. Nos dois primeiros casos, a publicação eletrônica tem pouca ou nenhuma utilidade, a não ser para o editor, como propaganda da versão impressa. No último caso, ainda é difícil vender informação desse jeito (pequeno valor por transação) e muito pouco aceito por uma comunidade acostumada com tudo de graça.
Para outros editores, como os de universidades e associações científicas, que nào tem o lucro como objetivo, o dilema papel/eletrônico é um falso dilema: ambos poderão coexistir e se complementar por muitos anos ainda. O mundo mercantilista e o mundo idealista ainda vão brigar muito.
Publicado em: Jornal Correio Popular, Campinas, 07/07/98.
Autor: Email: sabbatin@nib.unicamp.br