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Bibliotecas digitais

 

Renato Sabbatini

Imagine só: no futuro existirá uma "biblioteca universal", contendo todo o conhecimento humano registrado, que poderá ser acessado a partir do seu computador pessoal, através de uma conexão ultra-rápida à Internet.

Muita gente acha que a WWW é o embrião dessa biblioteca, mas ainda falta muito para chegarmos lá. A Web é uma criança, e em geral adiciona conhecimento novo, ao invés de registrar e preservar o antigo. Esse papel sempre foi atribuido às bibliotecas (literalmente, do grego, "coleção de livros"). É nas centenas de milhares de bibliotecas públicas e privadas que se encontra a maior parte desse conhecimento. Algumas, como a Biblioteca do Congresso dos EUA, são gigantescas, muito maiores do que todo o conteúdo atual da WWW. .

Analisando o problema de se ter um dia essa biblioteca universal, cientistas dos EUA e de outros países chegaram à conclusão que o caminho envolve a criação de "bibliotecas digitais", ou seja, todo o conteúdo dos jornais, livros e revistas que já foram ou serão publicados precisa ser colocado em formato capaz de ser armazenado, transmitido e lido por computadores. O próprio conceito de biblioteca pode ser ampliado quando isso for conseguido: também poderemos digitalizar obras de arte, objetos tridimensionais (como esculturas e artefatos históricos, animais e plantas, etc.), sons, música, filmes e vídeos.

Em 1994, a National Science Foundation , o maior organismo governamental de financiamento de pesquisa nos EUA, associada à NASA e ao Ministério da Defesa (DARPA), deu início a um formidável projeto chamado "Digital Libraries Initiative" (DLI). Vários projetos financiados por empresas privadas, principalmente consórcios de editoras, também tiveram início, como o Digital Libraries Federation. No Brasil, uma das maiores iniciativas de fazer uma biblioteca digital está sendo financiada pela FAPESP (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo), e se chama SciELO. Ele já conta com mais de 30 revistas científicas brasileiras de ótima qualidade, e tem acesso totalmente gratuito. O CNPq, através do seu Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia também tem um projeto de Bibliotecas Virtuais.

O projeto DLI-1 desenvolveu sistemas para colecionar, armazenar e organizar informação em forma digital e disponibilizá-la em redes de computadores. O DLI-2, que está se iniciando este ano, terá mais US$ 50 milhões de dólares nos próximos cinco anos, para desenvolver métodos de unificar essas bibliotecas e de interagir com elas através de interfaces inteligentes inteligentes. No entanto, para que uma biblioteca digital unificada se torne realidade, espera-se que a indústria privada tenha que gastar ainda alguns bilhões de dólares adicionais, e vai acontecer apenas dentro de uns 10 anos.

O problema maior das bibliotecas digitais vai ser como organizar e pesquisar a quantidade absolutamente brutal de informação que ela vai conter. Mecanismos de busca e catálogos eletrônicos como os que existem atualmente (Altavista, HotBot, Yahoo!, etc.) serão inadequados e primitivos perto do que está para vir. Uma pesquisadora da Microsoft resumiu o problema em uma frase: "é espantoso que consigamos achar alguma coisa na Internet usando os browsers e mecanismos de busca atuais". O sistema futuro terá que unificar materiais de muitas bibliotecas existentes em diferentes formatos e linguagens, e sumarizar a informação encontrada de tal modo que se torne fácil e rápido para o usuário navegar pela mesma. Além disso, terá que enfrentar o desafio colocado pela indexação de materiais que não são texto, tais como fórmulas matemáticas e químicas, imagens, sons, objetos, etc.

Sem esperar pelos resultados dessas pesquisas, milhares de bibliotecas digitais já estão sendo organizadas em todo o mundo, reunindo coleções de tudo é quanto tipo de dado imaginável e colocando-os na Web. Alguns, como o Projeto Gutenberg, o Projeto JSTOR, a Electric Library, a Encarta Library e a Alexandria Digital Library, tem centenas de milhares de obras já digitalizadas.

As bibliotecas digitais criarão novos dilemas e oportunidades. Por exemplo: como ficarão as atuais bibliotecas? Serão todas convertidas para o meio digital? E os bibliotecários? Serão uma espécie em extinção, como aconteceu com os calculistas e os linotipistas? Muitos especialistas acham que sim. Outros, no entanto, acham que os bibliotecários digitais do futuro terão novos papéis como "navegadores da informação ou organizadores do ciberespaço". E que as bibliotecas de papel sempre serão úteis para preservar o meio físico original de publicação. Por mais perfeita que seja a digitalização de um pergaminho do Vaticano, por exemplo, ela nunca substituirá o objeto em si.

Em outras palavras:pode ser que as bibliotecas do futuro sejam apenas uma espécie de museu…
 

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Renato M.E. Sabbatini é professor e diretor do Núcleo de Informática Biomédica da Universidade Estadual de Campinas, colunista de ciência do Correio Popular, e colunista de informática do Caderno Cosmo. Email: sabbatin@nib.unicamp.br

Veja também: Índice de todos os artigos anteriores de Informática do Dr. Sabbatini no Correio Popular.



Publicado em: Jornal Correio Popular, Campinas, 5/6/99.
Jornal: Email: cpopular@cpopular.com.br
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