Nas últimas eleições gerais que ocorreram nos Estados Unidos, os eleitores da Califórnia votaram em uma proposta de liberação do uso do tetra-hidro-canabinol (THC) para o tratamento de diversas doenças. Seria bastante estranho submeter a um plebiscito a autorização para o uso de um medicamento, se não soubéssemos qual é a planta que dá origem a esta útil substância ! No caso, é a Cannabis sativa, de onde são extraídos produtos que causam drogadição, tais como a maconha e o hashish, e cuja posse e comércio são ilegais em praticamente todos os países. A lei californiana dá permissão para que médicos, psicólogos e hospitais possam prescrever o THC a pacientes que tenham indicações médicas legítimas para esse uso, bem como para a comercialização de preparados quimicamente puros de THC por indústrias farmacêuticas.
Se ficasse por aí, estaria tudo muito bem, pois o mercado de medicamentos éticos (por prescrição médica, apenas) com potencial altamente aditivo, como morfina, sedativos, estimulantes, etc. já é regulado de forma adequada há muito tempo. Acrescentar THC a esta farmacopéia não seria nada demais (aliás, o THC já é fabricado legalmente com a finalidade de ser usado em pesquisas científicas). O estranho é que a lei permite que as pessoas tenham suas próprias plantações de Cannabis (uma planta fácil de cultivar até mesmo em apartamentos), detenham pequenas quantidades de maconha para uso próprio, ou a adquiram de alguém (quem ?). Na prática, isso acaba por dar validade ao tráfico ilegal de drogas, e torna extremamente difícil diferenciar entre usuários legítimos e ilegítimos da maconha e controlar a prescrição médica do THC. É a mesma coisa que permitir que as pessoas cultivassem papoulas (o que é permitido) com a finalidade de extrair morfina ou heroína (o que é proibido).
De qualquer forma, a pergunta é a seguinte: será que a maconha tem mesmo valor medicinal, como os seus defensores apregoam ? De fato, os extratos dessa planta são usados para fins medicinais desde 2.700 A.C., na China e na Índia. Antes de se disseminar na sociedade ocidental como uma droga recreativa, a maconha era usada no século passado como analgésico, antiespasmódico, sedativo, anestésico local, antidepressivo, antialérgico a antibiótico. No século 20, diversas pesquisas mostraram que o THC é realmente útil para diminuir a pressão intraocular de pessoas com glaucoma, e para aliviar a náusea e vômitos causados pela quimioterapia em pacientes com câncer e com AIDS. Foi por intensa pressão de grupos de aidéticos, por sinal, que a legislatura californiana resolveu levar adiante o projeto de lei. Outras aplicações terapêuticas da maconha, geralmente menos reconhecidas cientificamente (podem ser devidas a efeito placebo) são no tratamento da enxaqueca, ansiedade, distúrbios menstruais e ginecológicos, pressão alta e perda de apetite e depressão.
Pesquisas sérias tam temporal, levando a distorções perceptuais que podem colocar em perigo de vida, por exemplo, um motorista. Intoxicação em maiores dosagens pode causar aumento da freqüência cardíaca, depressão respiratória, desequilíbrio e incoordenação motora, sonolência, alucinações visuais, ansiedade, depressão, extrema labilidade emocional, reações paranóides, e até psicoses, com duração entre duas a seis horas.
Minha opinião é que se o THC realmente tem efeitos terapêuticos comprovados pela ciência médica, ele deveria entrar como preparado puro (sal básico) em medicamentos controlados pelo Ministério da Saúde, com faixa preta, prescrição obrigatória, e fabricados por empresas farmacêuticas com boa reputação. Por ser uma poderosa droga psicotrópica e alucinogênica, seu uso indiscriminado é perigoso. É um absurdo permitir que as pessoas cultivem sua própria maconha ou a comprem dos traficantes. Esperemos que isso não venha a ocorrer no Brasil, também.