Informática Médica |
Revista Check-Up 2 (12) (Setembro 1999)
Veja também: Índice de Artigos de Informática Médica de Renato M.E. Sabbatini
O impensável já está acontecendo: robôs mecânicos de alta precisão, aliados aos recursos da video-endoscopia e à realidade virtual, estão começando a auxiliar cirurgiões de todo o mundo a realizar proezas como cirurgias de revascularização do miocárdio, de reparo de válvulas cardíacas e neurocirurgias estereotáxicas. Mais espantoso ainda, em alguns projetos já divulgados o cirurgião estava a milhares de quilômetros do paciente, acionando os manipuladores da cirurgia endoscópica e visualizando o campo operatório através de um computador ligado a um sistema de telecomunicação por satélite.
Em maio do ano passado, por exemplo, cirurgiões cardíacos do Centro de Cardiologia de Leipzig, Alemanha utilizaram pela primeira vez braços robóticos para realizar uma cirurgia de pontes de safena. O sistema, chamado Intuitive, é desenvolvido e comercializado por uma empresa americana, que já vendeu dezenas deles para centros médicos de todo o mundo. O sistema utiliza três braços robóticos para a cirurgia, que são inseridos na cavidade torácica através de incisões de menos de um centímetro. Um braço opera uma microcâmara de vídeo, e os dois outros carregam os instrumentos cirúrgicos. O cirurgião comanda os braços robóticos através de manipuladores semelhantes aos de um endoscópio, e os braços robóticos reproduzem seus movimentos dentro do corpo do paciente.
A palavra robô vem do tcheco robota, que significa trabalho forçado. É uma dessas palavras criadas a partir da ficção científica (no caso, uma peça de teatro de autoria de Karel Çapek, de 1921). Ainda estamos muito longe, tecnologicamente, de ter um robô com capacidade, inteligência e autonomia suficientes para substituir o ser humano na maioria das tarefas, como aparece em filmes como "Star Wars". Os robôs que existem atualmente são modelos industriais, como os usados nas linhas de produção de automóveis, ou então dispositivos controlados remotamente, que reproduzem movimentos humanos com um reduzido grau de automação (como as "mãos" usadas para manipular elementos radiativos). A única coisa que os robôs industriais sabem fazer é reproduzir seqüências de movimentos altamente complexos, como agarrar, deslocar, soltar, apontar, tocar, puxar, etc., imitando um membro superior humano, com todos seus "graus de liberdade a mão do cirurgião está fazendo. Um software especial reduz a amplitude dos movimentos naturais a uma escala de micromovimentos da mão robótica, que ficam muito mais precisos ("motion scaling").
Para dar maior sensação de realidade, os atuadores robóticos também têm sensores de contato, que transmitem de volta informações sobre a resistência e a flexibilidade do material orgânico sendo manipulado. O sensor na mão do cirurgião dá então um "feedback" de força (chamado de transmissão efáptica") que torna muito mais natural a manipulação, como se ele estivesse usando um sistema puramente mecânico. A isso se denomina "telepresença".
A impressão que isso tudo não passa de um excesso de fascinação com alta tecnologia, entretanto, é desmentida por uma série de nítidas vantagens dos braços e mãos robóticas nas aplicações cirúrgicas. Eis aqui algumas delas:
Muitos centros clínicos e de pesquisa do mundo estão alvoroçados com a nova tecnologia e montando grupos que começaram a utilizá-la, pois não há dúvida que o futuro da cirurgia está aí. O mais recente foi montado pelo famoso Jonhs Hopkins Medical Center, de Baltimore, EUA. Denominado de Centro de Pesquisa de Engenharia em Sistemas Cirúrgicos e Tecnologia Integrada por Computadores, recebeu US$ 13 milhões da National Science Foundation, e tem uma equipe de cerca de 30 cirurgiões, radiologistas, engenheiros e cientistas da computação de várias universidades e hospitals. O objetivo é desenvolver robôs que tornem as cirurgias mais seguras, mais precisas, menos invasivas, e de menor custo para o paciente e para o sistema de saúde.
No Brasil ainda sistemas de projeto e manufatura baseados em computador, na indústria mecânica.
No entanto, se alguém acha que os robôs vão substituir os cirurgiões, está enganado. Não há base para esse receio, como diz o Dr. Randolph Chitwood, chefe da cirurgia da University of East Carolina: "O cirurgião se manterá sempre em contato com o paciente, mas essa nova tecnologia facilitará operações em espaços confinados.". Acrescentam os Drs. James H. Anderson e Russell H. Taylor, coordenadors do projeto da Johns Hopkins: "Os cirurgiões humanos ultrapassam de longe as máquinas em termos de adaptabilidade e capacidade de julgamento. Em cada aplicação, será o cirurgião que controlará as ações e movimentos dos robôs."
Em outras palavras, os robôs cirúrgicos totalmente autônomos ainda estão distantes de serem uma realidade, e mesmo que se tornarem realidade, possivelmente nunca serão utilizados, devidos aos problemas éticos e humanos que criarão. Isso não tem impedido que alguns grupos tentem obter esse ideal, como por exemplo o projeto MINERVA, da Universidade de Lausanne, na Suiça, que está desenvolvendo um robô neurocirúrgico guiado por um tomógrafo, que será totalmente autônomo. O MINERVA, que estreiou em 1993, já fez mais de 10 cirurgias totalmente automatizadas.
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Renato M.E. Sabbatini é doutor em ciências pela Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP, e diretor do Núcleo de Informática Biomédica da UNICAMP, em Campinas, SP. É também diretor de informática médica da AMB, e editor científico das revistas Informática Médica e Intermedic.
Email: renato@sabbatini.com
Copyright 1999 Renato M.E. Sabbatini
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Publicação na Web: 23/10/1999.