Informática Prática

 

Telemedicina: A Assistência à Distância

 

Renato M.E. Sabbatini

 

Revista Médico Repórter 3 (Fev. 1999)
Veja também: Índice de Artigos de Informática Médica de Renato M.E. Sabbatini


O fantástico progresso tecnológico da eletrônica e da informática nas últimas décadas afetou todos os setores da sociedade. A medicina não foi exceção. A partir da invenção do tomógrafo computadorizado na década dos 70s, por Godfrey Hounsfield e Allan Cormack, até o desenvolvimento da telemedicina, pelos cientistas da NASA, para as primeiras cápsulas espaciais tripuladas, aconteceu um impressionante aumento nos produtos biomédicos em que entram a informática, as telecomunicações e a microeletrônica.

O casamento entre os computadores e as telecomunicações, a partir da década dos 70, levou ao desenvolvimento de muitas aplicações interessantes de "transporte digital" de informação, de forma instantânea, e a longas distâncias, entre computadores localizados remotamente. Microondas, satélites e fibras óticas transformaram o mundo na grande "aldeia global" da atualidade. A Internet é o exemplo mais recente e mais conhecido dessa evolução.

E o que é a telemedicina? É o uso das tecnologias de telecomunicação para a interação entre profissionais de saúde e pacientes, com a finalidade de realizar ações médicas à distância. Para isso, podem ser usados quaisquer meios eletrônicos de telecomunicação, tais como telefonia convencional e digital, radiocomunicação, telefonia celular, intercâmbio de dados digitais através de redes locais e redes amplas, e a Internet.

Eletro pelo Telefone

Um exemplo simples de telemedicina é a tecnologia conhecida como "monitoração cardíaca transtelefônica". O paciente (geralmente um cardiopata crônico ou recém-infartado), usa um cardiobipe, um pequeno aparelho eletrônico. Depois de colocar três eletrodos em contato com o corpo, o paciente pressiona um botão no cardiobipe e recolhe alguns segundos do seu eletrocardiograma, que é armazenado na sua memória eletrônica. Em seguida, telefona para uma central de atendimento, se identifica, encosta o aparelhinho no bocal do telefone e pressiona outro botão, enviando o eletro pelo telefone. Em questão de poucos minutos, recebe pela mesma ligação uma orientação do médico de plantão, que analisou seu ECG e dá recomendações. Estudos científicos demonstraram que a mortalidade de pacientes que fazem a monitoração transtelefôn resultados de cerca de 2,5 mil monitorizações feitas pelos dentistas com que trabalha. Cerca de 15 % das chamadas tinham alguma anormalidade, e 72 cirurgias foram adiadas, porque o paciente estava com distúrbios cardíacos funcionais sérios o bastante. Em um caso, o paciente estava tendo um infarto na cadeira do dentista !

Conversa entre Médicos

Outra forma muito utilizada de telemedicina é o intercâmbio de informações sobre um paciente entre dois ou mais médicos. É a teleconferência, ou teleconsulta, que pode assumir muitas formas. A tecnologia mais sofisticada, denominada videoconferência, permite que os médicos conversem entre si, usando câmaras de vídeo e microfones, e um software especial de comunicação. Também podem ser enviadas imagens médicas de vários tipos (radiografias, tomografias, etc.), captadas através de um scanner, câmara fotográfica digital ou equipamentos médicos como otoscópios, oftalmoscópios, etc., cuja saída de imagem já pode ser enviada diretamente pelo sistema. Esses recursos são muito utilizados atualmente para sistemas de segunda opinião médica em contato com centros mais desenvolvidos, no Brasil ou no exterior.


Exemplo de imagem usada em teleradiologia (Sistema RVScreen)

Outra aplicação nesse sentido é a telepatologia, uma câmara digital associada a um microscópio permite o envio pela rede de imagens microscópicas. A principal desvantagem da videoconferência é que ainda exige linhas telefônicas digitais (geralmente ISDN) de alta velocidade, o que limita e encarece sua utilização mais ampla no meio médico.

Telemedicina Global

Na Itália, em Israel, na Inglaterra, na Grécia, no Canadá, nos EUA, no Japão e em outros países onde a telemedicina se enraizou profundamente, existem centenas de milhares de pessoas sendo beneficiadas por mais este avanço da informática médica. Na Itália, por exemplo, localidades isoladas no alto dos Apeninos ou em ilhotas do Adriático podem enviar eletrocardiogramas e radiografias para hospitais universitários de grandes cidades. Um estudo em Perúgia mostrou que cerca de 25 % das teleconsultas, como são chamadas, resultaram em uma mudança de diagnóstico ou tratamento pelo médico que enviava os dados, em 13 % das teleconsultas, causou a remoção do paciente para um centro mais avançado. Imaginem só o quanto aumentou a qualidade da medicina praticada.

Somente nos Estados Unidos, o país que mais se desenvolveu nessa área, atualmente existem mais de 600 programas de telemedicina. Beneficiam-se deles as instituições de saúde em uma grande variedade de situações, principalmente aquelas em que a medicina convencional não está disponível facilmente (áreas carentes de médicos e rurais, locais isolados, como plataformas petrolíferas, ilhas, montanhas, sítios de construção civil, navios em alto mar, etc., prisões, locais onde ocorreram sinistros, catástrofes naturais, grandes concentrações de gente, campos de batalha, e assim por diante.

O fato é que a medicina tenderá a se globalizar cada vez mais, ao tornar possível a interação entre médicos situados em diferentes países. Isso tem v opinião com um centro oncológico dos Estados Unidos.

Existem ainda alguns obstáculos a serem superados antes de se conseguir uma maior penetração da telemedicina em nosso meio são, entre outras: a pouca aculturação do meio médico a essa nova área tecnológica, os benefícios pouco aparentes, o alto custo do equipamento e software, a falta de linhas digitais baratas e de qualidade, o alto custo de comunicações digitais.

Internet e o Futuro

A Internet ainda é pouco utilizada para projetos de telemedicina de alta qualidade, principalmente devido à baixa velocidade e pouca confiabilidade na transmissão. Essas limitações não são tão importantes para uma categoria de telemedicina chamada de "Store and Forward" ("armazena e envia"). Nela, os dados do paciente (texto, imagens, etc.) são colocados em formato digital, armazenados e enviados por correio eletrônico ou pela WWW para um destinatário. Não é em tempo real, mas geralmente não tem problemas de velocidade.

Avanços na infra-estrutura de telecomunicações tais como o acesso à Internet através de conexões domésticas via rede de TV a cabo e por satélite (DirectTV), representam o futuro da telemedicina de baixo custo. Surgirá com muita força, por exemplo, a telemedicina doméstica. As pessoas poderão consultar seus médicos sem sair de casa e transmitir suas imagens, ECG, etc. No fronte mais avançado, veremos aplicações sofisticadas como a telepresença (exemplo: exames videoendoscópicos interativos remotos), realidade virtual (navegação remota em ambientes tridimensionais), telecirurgia e robótica (manipulação cirúrgica à distância com visão 3D), etc.

Conclusões

A telemedicina representa uma verdadeira revolução na prática médica do próximo milênio. As instituições e os profissionais de saúde precisam se preparar urgentemente para enfrentar e aproveitar eficientemente as novas tecnologias. Para essa tarefa, será crucial a formação de alianças interdisciplinares entre os provedores de tecnologia, os centros de pesquisa e ensino e as instituições de saúde, em uma sociedade global.
 

Alguns Recursos sobre Telemedicina na Internet

 

Journal of Telemedicine and Telecare: www.qub.ac.uk/telemed/jtt/  

Telemedicine Today Magazine www.telemedtoday.com/ 

Telemedicine and TeleHealth Networks: www.telemedmag.com/  

MedWeb Telemedicine: www.gen.emory.edu/medweb/medweb.telemed.html  

Telemedicine Information Exchange (TIE):tie.telemed.org/  

The American Telemedicine Association:www.atmeda.org   da USP, e diretor associado doNúcleo de Informática Biomédica da UNICAMP, em Campinas, SP. É também diretor de informática médica da AMB, e editor científico das revistas Informática Médica e Intermedic.
Email: renato@sabbatini.com

Copyright 1998 Renato M.E. Sabbatini
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Publicação na Web: 9/Fev/1999.

URL: http://www.sabbatini.com/renato/papers/reporter-medico-03.htm