Em resposta aos meus artigos publicados no Correio Popular ("Porque
a Homeopatia Funciona" e "Medicamentos
e Pesquisa Científica")., desafiando a medicina homeopática
a se posicionar quanto a comprovação real de sua eficácia;
a resposta esperada do "establishment" homeopata não poderia
ser mais decepcionante. Usando e abusando de injúrias pessoais,
afirmações genéricas e exclamações indignadas
com respeito à suposta respeitabilidade histórica da homeopatia
(e daí que existiam hospitais homeopáticos na Europa no Século
XIX ? Existiam também leprosários e hospícios em condições
absolutamente anticientíficas e terrificantes...) o médico
Edson Credídio mostrou que está mais interessado em defender
as suas posições do que em favorecer a verdade científica.
Para não deixar nenhuma dúvida do público com relação às minhas afirmações, realizei uma extensa pesquisa no mais completo índice de publicações científicas em Medicina, que é a base de dados MEDLINE, produzida pela US National Library of Medicine. Dos mais de 4,5 milhões de trabalhos publicados em mais de 10 mil revistas médicas e biológicas desde 1972, foram encontrados apenas 61 trabalhos de pesquisa que obedecem o padrão científico aceitável para a determinação objetiva do efeito de um medicamento, que é chamado de ensaio clínico prospectivo aleatorizado duplo-cego, conforme já expliquei. Esse número pequeno por si só já prova a extraordinária, mas nem um pouco estranha, falta de estudos científicos controlados sobre a eficácia da homeopatia. O que ele dá a parecer é que muitos médicos homeopatas não querem realizar esse tipo de estudo, pois como veremos adiante, eles comprovam de forma devastadora a quase total ineficácia dos medicamentos homeopáticos em uma grande gama de doenças e condições patológicas.
Ao contrário do sr. Credídio, cujos livros são
difíceis de se encontrar, qualquer leitor que tenha acesso à
Internet (a qual uso para trabalhar, e não para "brincar")
poderá checar os trabalhos publicados (com resumos em inglês),
no endereço http://www.nib.unicamp.br/recursos/homeopatia/homeopat.htm.
A pesquisa que realizei pode ser repetida pelos leitores no endereço
http://www.ncbi.nlm.nih.gov/PubMed,
usando as palavras-chave "homeopathy" e "clinical trials".
Só para dar alguns exemplos referentes ao estudos citados acima,
os medicamentos homeopáticos, quando comparados com placebos, não
mostraram NENHUM EFEITO estatisticamente significante nas seguintes situações:
no alívio da dor e melhoria da recuperação pós-operatória
em pacientes operadas de histerectomia abdominal; na diminuição
das áreas da pele ocupadas por verrugas das mãos de crianças;
na melhoria dos sintomas da asma alérgica a ácaros; no alívio
dos sintomas de artrite reumatóide e osteoartrite; na intensidade
e duração dos sintomas de resfriado comum; no tratamento
de reações alérgicas devidas ao pólen (polinose);
na diminuição da pressão arterial em pacientes com
hipertensão essencial; na intensidade da dor, trauma e sangramento
pós-operatório, na redução da enxaqueca, e
em muitos outros. Nos estudos em que foi experimentada também uma
terapia alopática, ela foi quase sempre superior ao placebo e à
medicação homeopática. Todos os trabalhos foram feitos
envolvendo equipes de médicos homeopatas, e foram publicados em
revistas de altissimo prestígio no meio médico, tais como
o International Journal of Clinical Pharmacology and Therapeutics, Lancet,
Journal of the Royal Society of Medicine, Dermatology, British Medical
Journal, European Journal of Clinical Pharmacology, Pediatrics, e outros.
Pude constatar apenas quatro estudos em que a homeopatia teve um resultado
ligeiramente superior ao placebo: em diarréias infantis, comparadas
com a reidratação oral; na duração dos sintomas
e repetição de infecções de otite média,
também em crianças, no efeito de beladona (um poderoso fitoterápico)
na dilatação pupilar em voluntários saudáveis;
e no grau de coceira e eritema após picadas de mosquito, usando
um gel homeopático. Portanto, foram 57 pesquisas negativas contra
4 positivas. Como cerca de 5 % de todos os estudos médicos podem
dar resultados positivos de forma aleatória, o resultado não
favorece de forma nenhuma a homeopatia como CIÊNCIA médica.
A bem da verdade, devemos dizer que a medicina alopática também
alega muitas vezes efeitos terapêuticos que não são
diferentes do placebo. Por exemplo, em um notável estudo, publicado
em 1989 na revista alemã Arzneimittelforschung, 81 % dos
pacientes com sinusite aguda e 67 % dos pacientes com sinusite crônica
se recuperaram depois de três semanas, independentemente se tinham
tomado placebo, medicação tópica alopática,
antibióticos, ou vários tipos de medicação
homeopática ! Isso vem comprovar o que eu escrevi no meu artigo
anterior, ou seja, que a recuperação natural de certas doenças
é muitas vezes interpretada como sendo resultado do efeito do medicamento.
A maioria dos médicos honestos sabe disso, mas esconde esse conhecimento
dos pacientes, pois isso é considerado coadjuvante do efeito terapêutico.
Desonesto é afirmar publicamente e em revistas científicas
que se trata de um efeito verdadeiro.
Os homeopatas, inocentemente ou não, usam muitas terapias em
paralelo à homeopatia, e depois afirmam que foi esse medicamento
que funcionou. Por exemplo, em um dos trabalhos citados acima, que deu
resultado positivo para o medicamento homeopático, os autores adicionaram,
segundo suas próprias palavras, "alguns sais minerais e toxinas
animais" ao mesmo. Não é de se espantar que tenha tido
efeito... Existe até uma tendência recente dos homeopatas
de violar os preceitos do Dr. Hahnemann, deixando de realizar diluições
tão grandes. Ora.... Aí é que vai ficar perigoso tomar
homeopatia, pois alguns dos princípios ativos são bastante
tóxicos (beladona, por exemplo, que pode matar, se forem ingeridos
poucos centenas de miligramas).
A homeopatia têm muitas coisas curiosas. Por exemplo, a glorificação
do Dr. Samuel Hahnemann e de seus escritos, que foram feitos há
mais de 200 anos atrás. A Medicina evoluiu consideravelmente depois
de tanto tempo, e um médico alopata seria crucificado pelos pacientes,
pagadores de serviços médicos e o Conselho Regional de Medicina,
se voltasse a usar sangrias, sanguessugas, cirurgias sem anestesia e cauterizações
com ferro em brasa, como era moda médica na época do Dr.
Hahnemann. Convenientemente, os homeopatas se "esquecem" que
a base principal da ridícula teoria médica do Dr. Hahnemann
era que todas as doenças da humanidade começavam na pele,
e eram geradas por um misterioso "princípio energético
da coceira"... Porque que só a homeopatia tem o direito de
recorrer a alfarrábios totalmente desatualizados e não sofrer
nenhuma sanção ética e legal ?
Desafio os homeopatas brasileiros a realizarem mais ensaios clínicos
duplo-cegos sobre a sua avantajada farmacopéia. Coloco-me, mesmo,
à disposição para ajudar a realizar um desses trabalhos,
de forma objetiva. Serei o primeiro a escrever publicamente, aqui e em
qualquer lugar que os homeopatas me indicarem, sobre a real eficácia
de seus medicamentos, se eles realmente forem comprovados. Pois, ao contrário
do que afirmou o sr. Credídio em seu artigo, eu sou professor e
pesquisador médico da Faculdade
de Ciências Médicas da UNICAMP, formado pela Faculdade
de Medicina de Ribeirão Preto da USP, com doutorado em fisiologia,
pós-doutorado na Alemanha, e tenho trabalhos publicados e premiados
em dezenas de revistas médicas internacionais. Sou plenamente capacitado
para julgar, portanto, a veracidade cientifica da homeopatia.
Publicado em: Jornal "Correio Popular", Campinas, novembro de 1997.
Para Saber Mais: A Homeopatia Funciona ?