 | Estudiosa: 'Na faculdade
de farmácia, quis entender os efeitos daquelas bolinhas no organismo' |
Quem acompanha o 'Fantástico', programa dominical da Rede
Globo, assistiu a uma série de reportagens sobre a homeopatia,
colocadas no ar há cerca de dois meses, por causa de um louco desafio
lançado pelo mágico norte-americano James Randi, um cético assumido,
com site na internet e tudo o mais. Ele ofereceu US$ 1 milhão para quem
provasse que os tratamentos homeopáticos realmente funcionam. A
incitação fez a TV BBC de Londres convocar uma equipe de cientistas
para, sob a supervisão da Academia Britânica de Ciências, a Royal
Society, fazer vários testes. O resultado da empreitada? Não foram
encontradas provas confiáveis suficientes nem de que a coisa é eficaz
nem de que não é. O próprio James Randi declarou que mais e mais
pesquisas devem ser promovidas para se chegar a uma conclusão.
Acontece
que o sistema terapêutico criado há cerca de 200 anos na Europa até
hoje causa discussões acaloradas no meio médico. Mas o fato é que,
indiferente às polêmicas, muita gente continua recorrendo a homeopatia,
às vezes para tratar doenças que vão e voltam (e não param de
atormentar), como as rinites. Consultamos médicos - homeopatas e
não-homeopatas - e adeptos para esclarecer o que é mito e o que é
verdade entre as afirmações mais comuns sobre a especialidade.
Quem
adere à homeopatia não deve fazer tratamentos alopáticos, para não
misturar as coisas. Mito Alopatia é a medicina
tradicional, a mais conhecida por todo mundo. Já a homeopatia é um
sistema terapêutico criado pelo médico alemão Christian Friedrich
Samuel Hahnemann (1755-1843), que trata doenças com substâncias ativas
ministradas em doses bem diluídas. Em linhas gerais, a homeopatia
propõe que se repense os conceitos de saúde e enfermidade e se baseia,
entre outros, no princípio da individualização. Isso quer dizer que
cada caso é um caso e o paciente deve ser avaliado não só pelo viés da
doença, mas como um todo - emoções incluídas.
Segundo
o médico Paulo Rosenbaum, responsável pelo departamento científico da
Escola Paulista de Homeopatia, essa especialidade da medicina não se
pretende hegemônica e não deve ser encarada como tal. Ou seja, não se
propõe a reinar sozinha, substituindo todas as outras terapias
convencionais. 'Em alguns casos, é necessário usar apenas medicamentos
alopáticos. Em outros, é possível combinar as duas formas de
tratamento, para obter melhores resultados', explica Flávio Dantas,
médico e professor da disciplina de homeopatia na Universidade Federal
de Uberlândia, em Minas Gerais. Aliás, é bastante comum que as pessoas,
mesmo se são adeptas ferrenhas dos remédios homeopáticos, recorram à
alopatia sempre que preciso. 'Muitos pacientes utilizam a homeopatia só
como terapia coadjuvante. Outros usam medidas alopáticas sem que o seu
médico homeopata saiba. Por
isso, fica até difícil separar o efeito de um tratamento e de outro',
defende Renato Sabbatini, pesquisador e professor de fisiologia e de
neurociências da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade de
Campinas (Unicamp).  | Alternativa: 'Antes da
homeopatia, a cada inverno minha vida se transformava em um inferno por
causa das crises de rinite' |
Para a homeopatia, as doenças somente surgem quando
há um desequilíbrio emocional. Mito É bem verdade
que a homeopatia defende que o desequilíbrio emocional pode provocar
doenças. Mas admite que nem sempre ele está por trás de uma enfermidade
- e, mesmo quando está, não costuma ser o único fator desencadeador.
'Há as causas alimentares, infecciosas, ambientais (como a poluição),
traumáticas e metabólicas', enumera o médico Flávio Dantas.
A
homeopatia pode ser considerada uma medicina preventiva. Verdade
'Mas isso não quer dizer que a pessoa nunca mais ficará doente. O que
se constata é que, com o tratamento homeopático, as crises de certas
doenças crônicas, como rinite, asma e gripes recorrentes, se tornam
cada vez mais raras, chegando a praticamente cessar em alguns casos',
explica Flávio Dantas. A farmacêutica Cleudí de Souza Pereira,
de 24 anos, constatou isso na pele. Quando cursava o segundo ano de
farmácia na Universidade de Guarulhos (SP), ela começou a ter contato
com pessoas que se tratavam com homeopatia e se diziam imunes a algumas
doenças recorrentes, como a rinite alérgica e a enxaqueca, que a
importunavam fazia tempo. No último ano da faculdade, Cleudí teve a
disciplina de homeopatia e se encantou de vez com a coisa. 'Comecei a
estudar mais o assunto fora da sala de aula e a fazer pesquisas para
entender o mecanismo dos remédios homeopáticos. Minha curiosidade era
entender os efeitos daquelas bolinhas no organismo. Na época, eu tinha
muitas dúvidas e não acreditava muito naquilo.' Mesmo assim, ela
decidiu procurar logo um médico homeopata para tentar tratar os tais
males que sempre voltavam a atacar. Hoje, dois anos depois e ainda
tomando as pílulas, Cleudí raramente é acometida pelas insuportáveis
crises de enxaqueca e de rinite.
A
homeopatia parece ser eficiente para tratar as doenças crônicas.
Verdade 'As doenças de funcionamento do organismo e as de
natureza alérgica quase sempre são tratadas com êxito pela homeopatia',
garante o médico Flávio Dantas. Muita gente jura que as bolinhas
brancas, como são conhecidos os remédios homeopáticos, funcionam
perfeitamente no combate aos males recorrentes. A arquiteta Gisele
Conde Toron, de 39 anos, que o diga. Ela procurou um
homeopata, pois estava cansada de sofrer com a sua rinite alérgica.
'Quando fui ao consultório, estava no auge das minhas crises. Em todo
lugar que eu freqüentava, tinha que espalhar caixas de lenços de papel,
pois meu nariz não parava de escorrer', lembra. 'A cada inverno, a
minha vida se transformava num inferno, pois a rinite virava gripes
terríveis.' Hoje, 15 anos depois de procurar o homeopata, Gisele se
sente vitoriosa. 'Posso dizer que não tenho mais rinite.'
No
entanto, há um detalhe: os especialistas da área defendem que as
bolinhas brancas não servem apenas para a categoria de enfermidades
consideradas 'mais simples'. Dizem que até portadores de doenças graves
podem obter benefícios se o tratamento homeopático for prescrito como
coadjuvante. 'Pacientes com câncer têm na homeopatia um recurso para
amenizar alguns sintomas penosos', diz Dantas. |