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A Nova TV da Internet

Renato Sabbatini

A tecnologia básica por trás da Internet foi desenvolvida para entrega de mensagens entre dois computadores quaisquer conectados à rede. Em outras palavras, é uma tecnologia ideal para correio eletrônico, quando se sabe exatamente qual é a origem e o destino da mensagem. O tamanho da mensagem não deve ser muito grande, e o tempo que demora para transportá-la entre os dois pontos da rede não é importante. A invenção desse protocolo aconteceu no final dos anos 70s, quando a principal aplicação era o email.
 
Agora tente adaptar essa tecnologia relativamente primitiva a novos serviços, como a Web, áudio e vídeo em tempo real, "chats" e realidade virtual. Tente transformar a Internet em uma sala de aula, um canal de TV ou em um jornal diário com textos e imagens. Você vai entender por que a Internet é tão inadequada para essas novas aplicações, que formam, hoje, o grosso dos recursos mais utilizados. E vai entender também por que o tráfego na Internet estará sempre engarrafado nos horários de pico, independentemente dos investimentos que forem feitos na infra-estrutura.

Para entender a razão, imagine o que representa transmitir um segmento de vídeo pela Web, por exemplo. Inicialmente o vídeo é digitalizado, ou seja, convertido em um arquivo de números binários, que é armazenado no servidor Web, e recebe um endereço (URL) determinado. Toda vez que um usuário solicita esse arquivo, ele é dividido pelo servidor em milhões de pequenos pedacinhos de comprimento igual, em número de bytes, chamados "pacotes", que são enviados seqüencialmente (um após o outro) àquele usuário. Se, nesse meio tempo, outros usuários remotos solicitarem o mesmo arquivo, o processo se repete, saturando o servidor e as linhas da Internet com pacotes idênticos.

É um tremendo desperdício. O ideal seria transmitir o mesmo pacote até que ele chegue o mais próximo possível dos usuários, e depois ele é copiado e passa a trafegar em caminhos diferentes para cada usuário. Desta forma, reduz-se dramaticamente a "largura da banda" necessária para transmitir o vídeo. Esse é o principio do sistema de "multicasting", que será a TV da Internet.

A técnica de "multicasting" a que me referi na coluna anterior é uma delas. Ao invés de enviar a seqüência dos bits que compõe uma gravação de vídeo (chamado de "streaming", em inglês) em paralelo para cada usuário que solicita a visualização de uma cópia, o servidor de "multicasting" envia apenas uma cópia para outro servidor na rede, que esteja o mais próximo possível de dois usuários quaisquer que estão recebendo o "streaming". A partir daí ele se bifurca, caminhando por vias diferentes, até os usuários. Imagine isso em uma escala muito maior, com milhares de usuários assistindo a um filme na TV-Internet, e você conseguirá visualizar a imensa economia de banda que se consegue com essa metodologia. É complexo, e exige que todos assistam ao mesmo tempo, ou seja, é uma técnica sincrônica, ou de "broadcasting" (semelhante à TV normal). Basta entender que no tronco principal, por exemplo, 10 mil usuários podem trafegar, com apenas um "streaming" sendo gasto, ao invés de 10 mil "streamings"… A qualidade acaba sendo melhor, também, por causar menos engarrafamento das vias de informação.

Um problema da técnica "multicasting" é que ela é usada apenas unidirecionalmente. Portanto, teoricamente não poderia ser usada para montar uma videoconferência bidirecional, ou seja, tornar a TV interativa. Uma aplicação óbvia para esse tipo de coisa ocorre no ensino a distância: depois de assistir a uma aula, por exemplo, os alunos podem fazer perguntas ao professor. Entretanto, isso já foi solucionado: o "multicasting" interativo permite que a palavra seja passada por um sistema de controle para um novo emissor de "multicasting", que começa então a dirigir o "streaming" para todos os outros participantes. A empresa israelense-americana Vicom, uma das líderes tecnológicas na área de videoconferência, foi a primeira a dominar essa tecnologia e já a oferece em seus produtos. Ela é representada no Brasil pela TES.

Não há dúvida que o futuro da Internet caminha em direção à TV e áudio de alta fidelidade transmitidos pela chamada "banda larga", ou Internet de alta velocidade, ou Internet 2, ou Next Generation Internet (NGI). A infra-estrutura para isso está sendo instalada em ritmo acelerado, e embora seja carissima, pois é toda baseada em fibra óptica, chegará um dia em que será mais ampla do que a atual estrutura de TV a cabo no Brasil, e provavelmente tão ampla quanto o próprio sistema telefônico convencional.

Pois bem, preparando-se para esse futuro, os engenheiros de desenvolvimento de aplicações têm se esforçado para otimizar o uso de uma infra-estrutura de velocidade intermediária (2 megabits por segundo) que já permita a TV na Internet com uma qualidade minimamente aceitável.

Tudo isso vai continuar a evoluir muito, tecnologicamente e mercadologicamente falando, e o futuro da TV da Internet, com a mesma qualidade da TV digital de hoje, está mais próximo do que imaginamos.
 

Para Saber Mais

Sabbatini, R.M.E.: Televisão interativa ou computador? Correio Popular, Caderno Cosmo, 25/2/2000.
Sabbatini, R.M.E.: Rádio e TV Internet. Correio Popular, Caderno de Informática, 12/8/1997.




Renato M.E. Sabbatini é professor e diretor associado do Núcleo de Informática Biomédica da Universidade Estadual de Campinas, colunista de ciência do Correio Popular, e colunista de informática do Caderno Cosmo. Email: sabbatin@nib.unicamp.br

Veja também: Índice de todos os artigos anteriores de Informática do Dr. Sabbatini no Correio Popular.



Publicado em: Jornal Correio Popular, Campinas, 1/9/2000 e 8/9/2000 .
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